A COP que ainda vamos ver
As águas de Belém ainda cercam as águas de Xapuri. Foto: Victor Manoel/Comitê Chico Mendes
Os rios têm vontade própria. Eles enchem, vazam, fazem curvas inesperadas e, invariavelmente, encontram seu caminho. O ano de 2025 foi como um desses rios caudalosos. Das nascentes à correnteza intensa em Belém.
O mundo olhou para a Amazônia. Chefes de Estado pisaram nosso solo, acordos foram assinados sob os flashes da imprensa internacional e promessas de bilhões ecoaram nos corredores climatizados. Mas, agora que os holofotes se apagam: qual COP fica para quem fica?
Aquela, a oficial, muitas vezes termina no momento em que a última luz do centro de convenções é desligada. A Conferência que nos interessa, a que Chico Mendes sonhava, é a que acontece agora, nesse nosso "desaguar".
Para nós, acreanos, a urgência climática não é um gráfico projetado em um telão de LED; ela tem data marcada no calendário. Sabemos bem o que é a crise quando chega o mês de março. Enquanto o mundo debate metas de carbono para 2030 ou 2050, nós contamos os centímetros do Rio Acre subindo, revivendo o trauma das alagações históricas que, ano após ano, invadem nossas casas.
É preciso ter coragem para dizer que a justiça climática não se faz apenas com canetas diplomáticas, mas com a vivência de quem enfrenta a água no joelho e, meses depois, a fumaça na garganta.
A COP que ainda vamos ver é aquela onde os territórios não são apenas paisagens de fundo, mas os protagonistas das decisões. É a conferência que reconhece que o "Empate", a tecnologia social de resistência criada por Chico e seus companheiros, é tão sofisticada e necessária quanto qualquer inovação tecnológica do Norte Global.
As águas continuam correndo no Acre. Foto: Victor Manoel/Comitê Chico Mendes
Quando reunimos juventudes, mulheres, extrativistas e indígenas para discutir bioeconomia e direitos humanos, estamos realizando a etapa mais difícil da diplomacia: a implementação. Estamos transformando a utopia em prática.
Que as águas de 2025 sigam seu curso até 2026. O mundo passou por aqui. Mas nós ficamos. E é aqui, no território, que a verdadeira história continua a ser escrita. Por todos os sonhos não veremos, mas temos o prazer de ter sonhado.
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