Jovens acreanas da Rede de Mulheres da Floresta reafirmam parcerias rumo à COP30 em Macapá
Encantando resistência, Comitê Chico Mendes e Rede de Mulheres da Floresta estiveram presentes na edição do Festival que falou sobre clima e juventude
A Rede de Mulheres da Floresta mostrou que a resistência se renova com juventude, afeto e articulação coletiva. Foto: Hannah Lydia
A Amazônia não pode mais esperar. E as vozes que vêm da floresta não querem mais ser escutadas apenas como um eco distante, mas como protagonistas na construção de políticas climáticas que respeitem sua realidade. É com essa força que jovens lideranças da Rede de Mulheres da Floresta, do Comitê Chico Mendes, participaram do Festival Amazônia Terra Preta, realizado de 5 a 8 de junho, em Macapá, Amapá.
A presença das representantes acreanas no festival não foi apenas simbólica. Foi coletiva e transformadora. Com o tema “Guardiões do Clima e Juventudes rumo à COP das Pessoas”, o evento reuniu ativistas, artistas, pesquisadores, juventudes e lideranças comunitárias de toda a Pan-Amazônia. Representando a Rede de Mulheres da Floresta, Sâmila Marçal, Letícia Santos, Ellen Souza e Yara Araújo destacaram a urgência de colocar os povos da floresta no centro das decisões ambientais.
“O que mais me marcou foi ver que a transição justa não pode ser apenas um conceito, mas deve garantir que os sistemas alimentares sustentáveis sejam fortalecidos, respeitando os saberes tradicionais e garantindo autonomia para as comunidades”, destacou Sâmila Marçal de Xapuri.
Letícia reforçou o papel das jovens mulheres na defesa dos territórios e na construção de soluções em rede. Foto: Hannah Lydia
Para ela, o festival foi um espaço real de construção coletiva, onde os debates sobre justiça climática partiram das vivências amazônicas. A presença das jovens mulheres da Rede expressa, na prática, um dos maiores desafios e legados deixados por Chico Mendes: fazer com que os povos da floresta sejam sujeitos ativos nas decisões que afetam seu presente e futuro. E não apenas alvos de políticas feitas à distância.
“No começo é bem assustador e dá um friozinho na barriga, mas depois é maravilhoso e a gente sai com gostinho de quero mais. Foi um momento de aprendizado e motivação, que me fez acreditar no poder da transformação coletiva em prol do planeta”, declara Letícia Santos de Assis Brasil.
Mulheres na linha de frente da resistência
Para Yara Araújo, de Rio Branco, coordenadora da Rede, o papel das mulheres na luta socioambiental vai além da presença em debates ou eventos: é cotidiano, enraizado nas práticas da luta diária pela sobrevivência e dignidade nos territórios.
Yara ressaltou a força das mulheres na luta por espaços de decisão e no enfrentamento das mudanças climáticas. Foto: Hannah Lydia
“A luta das mulheres é em defesa de garantir espaços para propagar suas vozes, demonstrar sua força e ocupar esses espaços de direito”, declara.
Ela ressalta que ainda há pouca participação feminina nos espaços de decisão dentro das comunidades. Por isso, projetos como a Rede de Mulheres da Floresta são fundamentais.
“Nosso papel é co-construir soluções em rede, para que as mulheres não se sintam sozinhas nessa jornada. Ter apoio mútuo e se sentirem empoderadas durante o processo”, diz Araújo.
A presença das jovens da Rede no festival levou a força da Resex Chico Mendes ao centro dos debates amazônicos. Foto: Hannah Lydia
Criado em 2021 pelo Instituto Mapinguari, o Festival Amazônia Terra Preta surgiu da necessidade de unir justiça climática e luta racial no coração da Amazônia, território essencial para o enfrentamento da crise climática. Yara também destacou o festival como um espaço de acolhimento e afeto:
“Foi especial levar as mulheres do projeto para que elas sentissem tudo isso. O pertencimento vem de dentro pra fora e contagia quem está no mesmo processo. A aliança dos povos da floresta se faz presente no encantamento em encontros como esse”, afirma.
A força que vem da juventude
A juventude também esteve no centro das reflexões. Ellen Souza, jovem liderança de Brasiléia, reforçou a importância de mobilizar as novas gerações.
Ellen destacou a juventude como esperança da floresta e força vital da luta socioambiental. Foto: Hannah Lydia
“É através da juventude que a gente vai conseguir atingir os lugares de mais difícil acesso, levar a comunicação, a arte, explicar por que a reserva foi criada, qual a importância dela estar de pé”, declara Ellen.
Iniciativas como o Festival Amazônia Terra Preta ajudam a preencher essa lacuna, ao promover o diálogo direto com os territórios mais afetados e valorizar o protagonismo das populações da floresta. Segundo Souza, se a juventude não se envolver, o futuro da floresta e das lutas por justiça e direitos pode estar ameaçado.
“A principal mensagem que eu trouxe foi a força da juventude. A organização do festival foi toda tocada por jovens, e isso me impactou muito. Eles estavam à frente, unidos, com tudo bem organizado. Foi bonito demais ver aquilo”, diz Souza.
Rumo à COP 30: alianças e articulações
Além da participação no festival, as representantes da Rede de Mulheres da Floresta voltam para o Acre com articulações importantes para a construção de uma presença forte na COP 30, que será realizada em Belém (PA) em 2025.
Mesmo com a COP 30 se aproximando de Belém, a maioria da população brasileira ainda desconhece o evento. Segundo pesquisa do Instituto Ideia e Instituto LACLIMA, 71% dos brasileiros não sabem o que é a COP. O levantamento, apresentado na Universidade de Oxford, alerta para o desafio de engajar o país no debate climático.
Sâmila defendeu que a Amazônia seja sujeito das decisões climáticas e que a COP 30 amplifique as vozes da floresta. Foto: Hannah Lydia
“Em Macapá, fortalecemos redes de diálogo entre juventudes, coletivos e lideranças comunitárias, e nossa mobilização agora mira Belém, garantindo que a COP das pessoas seja um espaço de protagonismo dos povos da floresta”, pontua Sâmila. “Queremos que as decisões tomadas na COP 30 respeitem a realidade amazônica. A mobilização coletiva será essencial para que nossos saberes ancestrais construam um futuro mais justo e sustentável”.
Sobre o Comitê Chico Mendes:
Criado em 1988 por militantes, familiares e organizações da sociedade civil na noite do assassinato do líder seringueiro e sindicalista Chico Mendes, o Comitê Chico Mendes surgiu como guardião de seus ideais e legado. Até 2021, atuou como um movimento social, promovendo a Semana Chico Mendes e o Festival Jovens do Futuro.
Diante do desmonte da Política Nacional de Meio Ambiente, que afetou violentamente os territórios e suas populações, especialmente as Reservas Extrativistas, decidiu dar um passo estratégico para fortalecer sua atuação em prol do bem-estar social, ambiental, cultural e econômico das comunidades tradicionais.
Em maio de 2021, após um amplo processo de escuta e diálogo entre membros e parceiros, optou-se pela institucionalização do Comitê Chico Mendes. A decisão representou um marco na trajetória da organização, permitindo a implementação de projetos estruturados sem abrir mão da essência de resistência, expressa nas Semanas Chico Mendes, realizadas desde 1989, e no Festival Jovens do Futuro, promovido a partir de 2020.