Orgulho que Encanta: mergulhe no filme que dá nova vida ao Boto-cor-de-rosa como símbolo LGBTQIAPN+

Em curta-metragem idealizado pelo artista acreano Theteu, o encantado emerge das águas amazônicas para contar uma história de amor

Primeiro cartaz do curta-metragem “Encantando", criado por Theteu. Foto: Acervo Pessoal

“Se esse curta tocar alguém a olhar pro rio e pro outro com mais ternura, já vou sentir que valeu a pena", é com essa afirmação que o artista nortista Theteu dá forma a seu mais novo projeto audiovisual: o curta-metragem “Encantando", uma ressignificação do conto tradicional do Boto-Cor-de-Rosa como uma narrativa LGBTQIAPN+. Neste dia 28 de junho, Dia Mundial do Orgulho de toda a comunidade, o criador conta os detalhes do projeto que é mais que um filme.

“Recontar essas histórias como uma narrativa LGBTQIA+ é uma forma de honrar essas travessias e, ao mesmo tempo, reivindicar espaço para corpos dissidentes dentro das nossas próprias encantarias”, explica Theteu, que é não-binário e morador de Rio Branco, no Acre. 

A escolha do boto não é acaso. Criatura fluida por natureza, ele se transforma, cruza mundos e desafia as convenções, segundo o entrevistado, assim como os corpos que fogem da normatividade e que, ainda hoje, enfrentam o preconceito em sua forma mais crua. O curta apresenta um romance delicado entre dois personagens masculinos.

“Só essa escolha já é uma forma de enfrentar o preconceito que tenta nos sabotar cotidianamente”, afirma o artista. 

Theteu, ao centro com a camisa escrito '‘Just Love'', acompanhado pelo coletivo Errantes, que desenha os cenários do projeto. Foto: Acervo Pessoal

A força do encantado e a coragem de narrar a si

Com roteiro próprio, apoio da comunidade local, financiamento da Fundação Garibaldi Brasil, além de trilha sonora da banda Maya com a música '‘Cor de Rosa'', Theteu vive o desafio de dar vida a essa história em forma de animação. Entre receios e descobertas, o processo criativo se revelou uma jornada de encontro e acolhimento. 

“Tenho encontrado pessoas que toparam participar e me acolheram, muitas delas da própria comunidade LGBTQIA+”, compartilha.

Banda Maya é responsável pela trilha sonora do filme. Foto: Acervo Pessoal

O maior cuidado, segundo ele, está em preservar o mistério e o respeito que cercam as figuras encantadas, sem esvaziá-las de sua força simbólica. Ao mesmo tempo, o curta insere temas urgentes, como a poluição dos rios e a exclusão de corpos dissidentes das narrativas tradicionais. 

“A maior potência é perceber o quanto nosso imaginário amazônico é fértil e vivo. Ele me atravessa, me conecta com a minha ancestralidade e cria pontes com outras pessoas que acreditam nesse sonho junto comigo’', defende.

Processo de criação do filme é coletivo e colorido. Foto: Acervo Pessoal

Ser encantado, ser quem nós somos

No contexto atual, em que a violência contra pessoas LGBTQIA+ ainda marca profundamente a região Norte, contar uma história de amor e cuidado entre dois homens na Amazônia é, acima de tudo, um ato político. Para Theteu, a arte é o lugar onde identidade, território e sonho se entrelaçam:

“Minha identidade de gênero é fluida, assim como as águas dos rios que atravessam o Norte. Tudo isso se mistura e vira força criativa. Quero um Norte onde nossas travessias sejam respeitadas, onde ser encantado, dissidente e amazônida não seja exceção, mas parte de uma floresta viva que acolhe’', afirma.

Mais do que contar uma história, o curta convida à reflexão sobre a relação entre pessoas, territórios e encantarias. Theteu espera que, ao assistir ao filme, o público sinta vontade de olhar para o outro com mais ternura e para o rio com mais respeito. 

Theteu e equipe que o acompanha no processo de criação do curta-metragem. Foto: Acervo Pessoal

“O orgulho se torna ferramenta para contar histórias que nos incluem, que nos acolhem e que mostram que nossos corpos dissidentes também merecem ser encantados”, declarou.

Sobre o Comitê Chico Mendes:

Criado em 1988 por militantes, familiares e organizações da sociedade civil na noite do assassinato do líder seringueiro e sindicalista Chico Mendes, o Comitê Chico Mendes surgiu como guardião de seus ideais e legado. Até 2021, atuou como um movimento social, promovendo a Semana Chico Mendes e o Festival Jovens do Futuro. 

Diante do desmonte da Política Nacional de Meio Ambiente, que afetou violentamente os territórios e suas populações, especialmente as Reservas Extrativistas, decidiu dar um passo estratégico para fortalecer sua atuação em prol do bem-estar social, ambiental, cultural e econômico das comunidades tradicionais. 

Em maio de 2021, após um amplo processo de escuta e diálogo entre membros e parceiros, optou-se pela institucionalização do Comitê Chico Mendes. A decisão representou um marco na trajetória da organização, permitindo a implementação de projetos estruturados sem abrir mão da essência de resistência, expressa nas Semanas Chico Mendes, realizadas desde 1989, e no Festival Jovens do Futuro, promovido a partir de 2020.

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