IA e meio ambiente? Semana Chico Mendes proporciona oficina que discute o impacto das novas tecnologias nos territórios

Dados, infraestrutura e território deram a linha do quinto dia de programação, revelando que a "nuvem" digital não é etérea

Ativistas cruzam a sabedoria dos "empates" tradicionais com estratégias de defesa contra o extrativismo digital. Foto: Alexandre Noronha

Para a maioria das pessoas, a Inteligência Artificial (IA) habita um lugar abstrato chamado "nuvem". No quinto dia da Semana Chico Mendes 2025, a programação em Rio Branco desfez esse senso comum para revelar a realidade: data centers que bebem rios, chips que exigem mineração predatória e algoritmos que atualizam antigas lógicas coloniais.

Realizada no escritório do Comitê Chico Mendes, no sábado (20), a oficina “Inteligência Artificial e Meio Ambiente: Dados, Infraestruturas e Território”, facilitada pelos pesquisadores acreanos Gustavo Souza (PNUD/ONU e Desvelar) e Sinuhe Cruz (Fiocruz), a atividade propôs um "empate digital": usar o conhecimento acumulado na luta socioambiental para enfrentar as novas ameaças tecnológicas.

Gustavo Souza, pesquisador da Desvelar, abriu o diálogo com um alerta estratégico. Ele explicou que as infraestruturas que sustentam a IA, servidores gigantescos e redes de transmissão, estão em rápida expansão e demandam volumes massivos de recursos hídricos e energéticos.

Pesquisadores acreanos, Gustavo Souza e Sinuhe Cruz retornam ao território para alertar. Foto: Alexandre Noronha

“Essas ameaças relacionadas à inteligência artificial e às infraestruturas que servem de sustento para elas estão se aproximando cada vez mais dos nossos territórios. Alguns estados já enfrentam pressões, especialmente sobre recursos hídricos e minerais”, pontuou Gustavo.

Para ele, trazer essa discussão para o Acre, um estado marcado por conflitos históricos de terra, é uma questão de sobrevivência e inteligência política:

“É importante que no Acre, um território que já é disputado e que tem na sua história a disputa, a gente esteja antecipadamente preparado e com repertório para discutir esses desafios e conectar as pautas socioambientais e digitais”.

Um novo tipo de "Empate"

Sinuhe Cruz, especialista em proteção de dados, destacou que o objetivo não era uma aula unidirecional, mas uma construção coletiva que ele chamou de "territorializar o debate".

“A gente queria envolver as pessoas e aproveitar o conhecimento que elas já têm. E a gente teve uma troca muito rica, porque as pessoas trouxeram a vivência delas, o acúmulo no ativismo socioambiental, e a gente conseguiu conectar isso com a pauta dos direitos digitais”, explicou Sinuhe.

Durante a dinâmica, os participantes analisaram casos concretos de violações documentadas por jornalistas, traçando paralelos entre os "empates" da época de Chico Mendes e as novas estratégias necessárias para bloquear o extrativismo de dados e recursos naturais promovido pelas Big Techs.

O "Desaguar" da COP 30 no digital

A escolha da Semana Chico Mendes para sediar esse debate não foi por acaso. Segundo Gustavo, o evento concentra militantes que vivenciaram a COP 30 e que já estão organicamente pautando o futuro da floresta.

A oficina debateu como a "nuvem" da Inteligência Artificial consome água e energia da Amazônia. Foto: Alexandre Noronha

“A Semana Chico Mendes acabou se tornando o espaço mais adequado, por reunir pessoas que já estão interagindo e pautando os debates socioambientais... e que a gente acredita que precisam ter esse contato com o digital também”, afirmou.

A oficina serviu como um protótipo para um movimento maior de letramento digital crítico na região. 

“A gente quer, cada vez mais, territorializar esse debate, porque a inteligência artificial está em voga no mundo todo, mas é difícil conectar isso com o território e com as discussões locais”, reforçou Sinuhe.

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