Na Alemanha, Comitê Chico Mendes reforça plataforma de comunidades tradicionais e povos indígenas em conferência climática

Pela primeira vez, o Comitê Chico Mendes participou da conferência preparatória da ONU

A luta iniciada por Chico Mendes nos seringais do Acre segue ecoando nos espaços de decisão global. Foto: Reprodução

O Comitê Chico Mendes marcou presença na 13ª Reunião do Grupo de Trabalho Facilitador (FWG) da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas (LCIPP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), realizada em Bonn, Alemanha, entre dias 10 e 13 de junho.

“Essa conferência foi uma grande oportunidade de aprendizado e de articulação. A gente foi para fortalecer a presença das comunidades locais nos espaços de decisão climática, e também para somar à construção de uma visão estratégica baseada na ação climática justa”, explica Angélica Mendes, neta de Chico Mendes e liderança do Comitê.

Essa foi a primeira participação do Comitê no espaço, que funciona como mecanismo de incidência internacional criado para garantir a presença e escuta ativa de povos indígenas e comunidades tradicionais nas negociações climáticas. Representado por Angélica Mendes e pela jovem liderança Kailane Silva, o Comitê levou à plataforma a pauta histórica da Aliança dos Povos da Floresta.

Angélica e Kailani participaram do FWG 13 (Grupo de Trabalho da Plataforma), que reuniu representantes de diversos países. Os diálogos giraram em torno de temas como adaptação climática, segurança alimentar e estratégias comunitárias de enfrentamento aos impactos do clima.

“Falamos sobre a importância de reconhecer os territórios como uma estratégia de defesa diante das mudanças climáticas. E de como os saberes ancestrais, a cultura e a juventude são partes fundamentais dessa adaptação. Não dá pra pensar em adaptação só para cidades. A floresta também precisa de soluções climáticas pensadas pelos seus próprios povos”, completou Angélica.

Comunidades tradicionais mundo a fora

A Plataforma LCIPP foi criada para sistematizar e integrar os conhecimentos, práticas e tecnologias dos povos indígenas e comunidades tradicionais às decisões da Convenção. Em 2018, a estrutura de funcionamento foi estabelecida com a criação do Grupo de Trabalho Facilitador, composto por sete representantes indígenas e sete indicados pelos países. Em Bonn, o novo plano de trabalho da Plataforma (2025–2027) trouxe inovações importantes, como abordagens coletivas e a definição de temas centrais. Neste ciclo, o foco é “gestão holística, transição justa e justiça climática”.

Angélica destacou que a plataforma ainda tem uma sub-representação dessas populações e que o fortalecimento da articulação com jovens, mulheres e anciãos é essencial para garantir que as soluções discutidas no âmbito global respeitem e considerem as realidades dos povos da floresta.

“A Aliança dos Povos da Floresta já mostrou no passado que é possível conquistar políticas públicas e direitos quando caminhamos juntos. Levar essa visão para espaços como esse é fundamental. Se unirmos as lutas de povos indígenas e comunidades extrativistas, podemos fazer frente aos retrocessos e fortalecer a defesa dos nossos modos de vida”, afirmou.

Não dá pra pensar em adaptação só para cidades. A floresta também precisa de soluções climáticas pensadas pelos seus próprios povos
— Angélica Mendes

Durante a SB62, três frentes principais foram acompanhadas pelas representantes do Comitê: comunidades tradicionais, cultura e juventudes. Para Angélica, essas dimensões estão profundamente conectadas

Durante a semana, representantes das comunidades locais reivindicaram ao Grupo Facilitador e à UNFCCC o reconhecimento formal da categoria “comunidades locais”, além de financiamento contínuo, tradução intercultural e participação ativa nas decisões. Pela primeira vez desde 2019, o espaço contou com forte presença brasileira e contribuições concretas da sociedade civil, incluindo a proposta de um grupo de trabalho específico para comunidades locais.

“A permanência nos territórios depende da valorização da cultura e do protagonismo das juventudes. São os modos de vida que protegem a floresta e eles só se mantêm vivos se forem defendidos e reconhecidos como centrais no enfrentamento da crise climática", a neta de Chico deixa claro.

Além do Comitê Chico Mendes, organizações como a Rede Cerrado, o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu, o Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), a Rede de Povos e Comunidades Tradicionais, a Associação PomerBR e jovens do programa Kuntari Katu participaram da delegação brasileira, com apoio de instituições como o Instituto Clima e Sociedade, ICV, IIEB e IPAM.

A participação do Comitê também visou preparar o caminho para a COP30, que acontecerá em Belém, em 2025. A próxima reunião da Plataforma está marcada para novembro, também na capital paraense, e será uma nova oportunidade de consolidar o protagonismo das comunidades tradicionais nas soluções climáticas.

Sobre o Comitê Chico Mendes:

Criado em 1988 por militantes, familiares e organizações da sociedade civil na noite do assassinato do líder seringueiro e sindicalista Chico Mendes, o Comitê Chico Mendes surgiu como guardião de seus ideais e legado. Até 2021, atuou como um movimento social, promovendo a Semana Chico Mendes e o Festival Jovens do Futuro. 

Diante do desmonte da Política Nacional de Meio Ambiente, que afetou violentamente os territórios e suas populações, especialmente as Reservas Extrativistas, decidiu dar um passo estratégico para fortalecer sua atuação em prol do bem-estar social, ambiental, cultural e econômico das comunidades tradicionais. 

Em maio de 2021, após um amplo processo de escuta e diálogo entre membros e parceiros, optou-se pela institucionalização do Comitê Chico Mendes. A decisão representou um marco na trajetória da organização, permitindo a implementação de projetos estruturados sem abrir mão da essência de resistência, expressa nas Semanas Chico Mendes, realizadas desde 1989, e no Festival Jovens do Futuro, promovido a partir de 2020.

Anterior
Anterior

Com investimentos de até R$ 8 milhões, Edital Dabucury abre inscrições para comunidades indígenas do Acre

Próximo
Próximo

Comitê Chico Mendes abre seleção para Técnico Administrativo e Gestão de Comunidades; confira como se inscrever