“O Comitê faz o trabalho que Chico fazia": pré COP30, Festival Jovens do Futuro mobiliza final de semana em Rio Branco

Dois encontros preparatórios e um baile temático reforçaram o papel da juventude na defesa da Amazônia

Brisa Flow agitou a noite do baile do Festival Jovens do Futuro. Foto: Hannah Lydia/Comitê Chico Mendes

A sexta edição do Festival Jovens do Futuro consolidou o evento como um dos principais espaços de mobilização política do Acre, nos últimos dias 5 e 6 de setembro. Realizado em Rio Branco pelo Comitê Chico Mendes, o festival reuniu centenas de jovens, lideranças comunitárias, artistas e comunicadores para experimentar soluções para os desafios da Amazônia diante da emergência climática. 

Este ano, o evento se destacou ao promover dois encontros preparatórios para a COP30 e um baile-pré-COP, conectando o debate local com as negociações globais sobre o futuro do planeta. A rapper, compositora, cantora, produtora e cineasta Brisa Flow foi a grande atração nacional do Festival.

O festival combinou debates, oficinas, apresentações artísticas e espaços de formação. A produtora Denise Oliveira, integrante da equipe do Comitê Chico Mendes, destacou a importância desta edição para o fortalecimento da rede de jovens da floresta:

“Está sendo uma emoção só, porque, graças a Deus, tudo deu muito certo, sem atrasos, sem perrengues”, contou.

Jabuti Bumbá encantou o cortejo de abertura do baile do Festival. Foto: Hannah Lydia/Comitê Chico Mendes

Preparando a juventude para a COP30

Uma das grandes novidades do Festival Jovens do Futuro 2025 foi a realização de dois encontros preparatórios para a COP30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que acontecerá em Belém, no Pará, no próximo ano. A primeira foi a formação "COP, que bicho é esse?", que aconteceu na sala de Telejornalismo do bloco de jornalismo da Ufac e o encontro “Crias de Chico na COP30", no auditório do eAmazônia, também na Universidade.

Thamyres Costa, membro da equipe do Comitê COP30 e que ministrou, ao lado de Anaís Cordeiro, a primeira formação, reforçou a importância da participação ativa da sociedade civil nos espaços de decisão:

“A importância da sociedade civil para a COP, além de fiscalizar o que o governo e os negociadores estão fazendo, é ecoar o nosso chamado, levar a nossa palavra para as mesas de negociação. Nós somos os mais afetados pela crise climática, vivenciamos as secas no nosso cotidiano. A nossa voz precisa ser ouvida, porque o nosso povo sabe como resolver essa crise. A nossa caminhada pode ser nova, mas o nosso povo não: já estamos aqui há muito tempo lutando pela floresta.”

Entre os nomes presentes, a fala de Raimundo Mendes, o Raimundão, histórico parceiro de Chico Mendes e liderança do movimento seringueiro, foi um dos momentos mais marcantes. Em sua intervenção, ele fez uma análise sobre o atual cenário político e a importância de fortalecer as entidades sociais:

“Hoje, as organizações — seja sindical, seja cooperativista, seja associativista — estão se movimentando, estão trabalhando. Aquilo que tinha sido desestruturado, agora não, agora estamos reconstruindo. E vamos fazer tudo que pudermos, no próximo ano, para dar continuidade a uma política que nos dá liberdade e o direito de nos organizarmos, de discutir a sociedade e o nosso futuro.”

Fervo também é luta

O baile temático, que também foi marcado como pré-COP, reforçou a proposta de transformar a mobilização climática em um espaço de celebração e pertencimento. A programação teve início às 17h30, com o cortejo do Maracatu recepcionando o público na entrada do Parque da Maternidade, seguido de boas-vindas e abertura oficial

A noite seguiu com o hip-hop de V17 Mc de Plácido de Castro, a música ritualizada de Yubé e Siã Hunikuin, além dos sons urbanos de Kaemizê e a força do rock regional da Banda Excomungado. Entre um show e outro, ataques poéticos com artistas como El Tchuco Mc (Bujari) e Kaeli Mc (Cruzeiro do Sul) garantiram que a palavra fosse também instrumento de denúncia e afeto.

Outro momento simbólico foi a leitura da Carta ao Jovem do Futuro por Lívia Mendes, neta de Chico, reforçando o elo entre gerações. A noite ainda contou com Banda Balseiro, DJ Lily no encerramento, e o tão aguardado show de Brisa Flow.

Para muitos jovens, participar do festival foi mais do que um convite ao engajamento: foi também uma oportunidade de aprendizado e construção de identidade coletiva. O artista e produtor Elias Silva relatou a experiência como um marco pessoal e profissional:

“Tá sendo maravilhoso. Sempre quis participar de alguma forma dentro do festival e, principalmente, em uma atividade do Comitê. Trabalhar na produção me trouxe muita experiência e conhecimento sobre o movimento. Para quem vê de fora é uma coisa, mas, quando a gente está dentro, consegue aprofundar ainda mais”, contou.

Legado de Chico

Para Denise, o festival representa um marco de retomada após os desafios enfrentados em 2024, quando a crise das queimadas e a fumaça intensa afetaram diretamente a saúde da equipe e a realização do evento:

A nossa voz precisa ser ouvida, porque o nosso povo sabe como resolver essa crise
— Thamyres Costa

“Essa edição foi muito simbólica. Em 2023, a gente estava no pique total, mas no ano passado enfrentamos um clima de insegurança, parte da equipe ficou doente, e tivemos que levar tudo para dentro do cinema e teatro. Realizamos, mas foi difícil. Este ano, a retomada foi incrível. Tivemos o apoio de toda a equipe, dos jovens, de parceiros, e todos se dedicaram com muita responsabilidade e cuidado”, afirmou.

Elias também destacou a diferença entre viver o festival como público e atuar na equipe:

“Como público, a gente aproveita, se diverte. Participando da produção, a gente também se diverte, mas aprende muito e ainda ajuda as pessoas que estão chegando. Essa troca faz toda a diferença.”

O festival carrega o nome e o espírito de Chico Mendes, seringueiro, líder sindical e ambientalista assassinado em 1988, cuja luta pela preservação da floresta e pelos direitos das populações tradicionais segue inspirando novas gerações. 

Raimundão lembrou que a luta pela floresta é coletiva, mas também exige organização política e unidade entre gerações:

“Mais homens, mulheres, como a grande maioria de vocês que estão aqui, estão tendo essa consciência, assim como também as autoridades, para fazer com que ela aconteça, e aconteça com qualidade, trazendo frutos que a sociedade brasileira e a sociedade do mundo estão precisando […] O Comitê faz o trabalho que o Chico fez”, disse.

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