“Sem organizações com compromisso, avançamos rumo ao fim", diz Angela Mendes sobre Balanço Ético da COP30
Ela reforça a importância das reservas extrativistas e do conhecimento tradicional na construção de soluções para a crise climática
Angela Mendes no Balanço Ético Global (BEG) para América Latina, América do Sul e Caribe, em Bogotá, na Colômbia. Foto: Rogério Cassimiro/MMA
A defensora Angela Mendes, filha de Chico Mendes e presidenta do Comitê Chico Mendes, participou do Balanço Ético Global (BEG) para América Latina, América do Sul e Caribe, em Bogotá, na Colômbia, no dia 21 de agosto. O encontro, realizado na capital colombiana, reuniu 25 lideranças de diferentes setores — entre acadêmicos, intelectuais, ativistas, representantes de territórios e organizações sociais — com o objetivo de construir contribuições estratégicas para o documento oficial que será apresentado na COP30, em novembro, na cidade de Belém (PA).
O BEG é uma iniciativa inédita da presidência da COP30 e se estrutura como um dos quatro Círculos de Governança da Conferência, inspirado no processo do Global Stocktake da Convenção do Clima da ONU. Diferente dos espaços tradicionais de negociação, o BEG tem como propósito aproximar decisões políticas da urgência de sua execução, incorporando dimensões éticas, culturais, territoriais e intergeracionais à agenda climática.
“Foi uma experiência muito interessante, primeiro pelo formato. Foi um encontro leve, com uma dimensão mais poética. Ficamos todos em círculo, nos olhando, compartilhando histórias e percepções. Apesar dos temas tensos, conseguimos dialogar com abertura e escuta verdadeira”, relatou Ângela.
Uma bússola para decisões justas
O BEG foi composto por seis Diálogos Regionais presenciais — América do Norte, América Latina e Caribe, África, Europa, Ásia e Oceania — e diversas iniciativas autogestionadas. Seu objetivo foi construir uma síntese global que traduza as experiências, visões e propostas da sociedade civil, com base em perspectivas éticas e inclusivas.
“Acredito que os conhecimentos tradicionais dessas populações são uma grande contribuição para enfrentar a crise climática”
Entre os temas debatidos, destacavam-se:
como os países estão cumprindo as metas de mitigação, adaptação, financiamento e transformação ecológica;
o nível de compromisso ético e de inclusão social nas ações;
o fortalecimento da cooperação global para cumprir a Missão 1,5°C, meta que busca limitar o aquecimento global a no máximo 1,5°C.
A Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, liderou os diálogos no encontro que defendeu os saberes tradicionais como força política na COP30. Foto: Rogério Cassimiro/MMA
Segundo a organização, as contribuições reunidas no BEG beneficiarão governos, empresas, instituições financeiras, negociadores e a sociedade civil, ao propor caminhos éticos, justos e bem planejados para enfrentar a crise climática.
Reservas extrativistas como estratégia global
Ao representar o Comitê Chico Mendes, Ângela levou ao diálogo uma mensagem central: a importância das reservas extrativistas e dos conhecimentos tradicionais como ferramentas indispensáveis para o enfrentamento da crise climática.
“Sempre levo a importância das reservas extrativistas como um espaço de manutenção e fortalecimento da identidade extrativista. Acredito que os conhecimentos tradicionais dessas populações são uma grande contribuição para enfrentar a crise climática. Só vamos conseguir frear o avanço desse caos com o reconhecimento e a valorização dos povos da floresta, a destinação correta dos seus territórios e o fortalecimento de suas culturas”, destacou.
25 lideranças estiveram presentes no encontro em Bogotá. Foto: Rogério Cassimiro/MMA
Para Ângela, a participação do Comitê nesse espaço demonstra a relevância histórica e atual do legado de Chico Mendes:
“É muito importante ver o Comitê inserido entre 25 lideranças. O convite para estar nesse espaço mostra que nosso trabalho tem visibilidade e contribui para pautar decisões globais.”
COP30 na Amazônia
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) será realizada entre 10 e 21 de novembro de 2025, em Belém do Pará. Será a primeira vez que a Amazônia recebe uma COP, um marco histórico que reconhece o papel estratégico da região na regulação climática global.
Segundo a presidência da conferência, a COP30 deve estabelecer um novo marco climático internacional, assim como ocorreu na COP21 de Paris (2015), que deu origem ao Acordo de Paris. A expectativa é que a COP30 avance na implementação das decisões já acordadas ao longo de mais de 30 anos de negociações e defina mecanismos efetivos de:
“O convite para estar nesse espaço mostra que nosso trabalho tem visibilidade e contribui para pautar decisões globais”
financiamento climático para países em desenvolvimento;
adaptação às emergências climáticas;
transição para modelos de desenvolvimento sustentáveis e justos.
Ângela Mendes acredita que esse protagonismo da Amazônia e das populações tradicionais precisa estar no centro do debate:
“Quando a presidência da COP e o Ministério do Meio Ambiente fizeram esse mapeamento para o diálogo, buscaram justamente pessoas com histórico de atuação nessa pauta. Quem estava lá defende a participação dos povos nos grandes espaços de decisão e de debate, principalmente quando falamos de clima.”
BEG discutiu políticas e promessas que estarão presentes na COP30. Foto: Rogério Cassimiro/MMA
Caminho para a COP30
A participação de Angela Mendes no BEG, em Bogotá, reafirma o compromisso do Comitê Chico Mendes com uma agenda climática que respeita os povos da floresta, valoriza seus saberes e defende suas identidades. O encontro mostrou que não há solução justa para a emergência climática sem a inclusão direta das populações tradicionais nos espaços de decisão.
A COP30, em Belém, será um ponto de virada: a oportunidade de transformar compromissos antigos em ações concretas e éticas, alinhando ciência, política, justiça social e diversidade cultural.
“Se não fossem as pessoas e as organizações ao redor do mundo que carregam esse compromisso, estaríamos avançando com muito mais rapidez rumo ao fim”, concluiu Ângela.
Sobre o Comitê Chico Mendes:
Criado em 1988 por militantes, familiares e organizações da sociedade civil na noite do assassinato do líder seringueiro e sindicalista Chico Mendes, o Comitê Chico Mendes surgiu como guardião de seus ideais e legado. Até 2021, atuou como um movimento social, promovendo a Semana Chico Mendes e o Festival Jovens do Futuro.
Diante do desmonte da Política Nacional de Meio Ambiente, que afetou violentamente os territórios e suas populações, especialmente as Reservas Extrativistas, decidiu dar um passo estratégico para fortalecer sua atuação em prol do bem-estar social, ambiental, cultural e econômico das comunidades tradicionais.
Em maio de 2021, após um amplo processo de escuta e diálogo entre membros e parceiros, optou-se pela institucionalização do Comitê Chico Mendes. A decisão representou um marco na trajetória da organização, permitindo a implementação de projetos estruturados sem abrir mão da essência de resistência, expressa nas Semanas Chico Mendes, realizadas desde 1989, e no Festival Jovens do Futuro, promovido a partir de 2020.
Ela reforça a importância das reservas extrativistas e do conhecimento tradicional na construção de soluções para a crise climática