Estilista Day Molina homenageia Chico Mendes com nova coleção de moda
A estilista e ativista apresenta sua nova coleção na Casa de Criadores, em São Paulo, após imersão afetiva na Reserva Extrativista Chico Mendes
Day Molina confecciona coleção que fala da ancestralidade da luta da floresta. Foto: Karla Martins
A estilista e ativista Day Molina vai homenagear o legado de Chico Mendes por meio de sua mais nova coleção que será apresentada na próxima edição da Casa de Criadores, em São Paulo, no próximo sábado, 26. Após um intenso processo criativo que começou no chão da floresta e nos encontros com familiares e companheiros de luta de Chico.
“Para mim, quanto criadora, uma coisa que faz total sentido no meu processo criativo é mergulhar, é ouvir pessoas, é ter essa escuta afetiva, é me apaixonar pelas histórias”, afirma Day, que passou dias na Reserva Extrativista Chico Mendes, em Xapuri.
A trajetória de Molina é marcada por entrelaçamentos entre moda, memória e militância.
“Eu sou neta e bisneta de costureiras nordestinas do Agreste de Pernambuco. Minha avó materna é indígena do povo Funio, e eu cresci vendo ela costurar”, conta. “Por outro lado, meu avô paterno era sociólogo, ativista político, exilado da ditadura, vindo de uma região do Peru que faz fronteira com o Acre. Então, costura e sociologia sempre estiveram presentes na minha vida”.
Processo ancestral
É com esse olhar interseccional que a estilista criou sua marca em 2016, após anos trabalhando com figurino, direção de arte e produção de moda. Com formação em design de moda pela Universidade de Buenos Aires e sociologia da arte em São Paulo, ela criou sua marca autoral como resposta à ausência de identidade nas grandes marcas.
“Essa relação ancestral sempre leva a gente pelo caminho que a gente tem que estar mesmo”, diz Molina. Foto: Reprodução
“A Nalimo [sua marca de moda] nasceu dessa necessidade de me ver, de ver minha cultura, nossa história e ancestralidade nas roupas. Foi também um jeito de honrar o trabalho invisível da minha avó, que costurou a vida inteira e nunca foi valorizada”, relembra.
A admiração por Chico Mendes vem de longe. Desde a infância, a entrevistada teve contato com livros e quadrinhos que narravam a história do líder seringueiro.
“Eu sempre admirei muito Chico Mendes. Em 2022, eu tive a chance de vestir Ângela para um evento especial na Semana do Clima em Nova York, com Janja, Lula e outros ativistas. Isso foi um marco para mim”, lembra.
Moda sobre a luta seringueira
A ideia da coleção nasceu ali, mas só ganhou corpo com a vinda ao Acre. A coleção, que será lançada no dia 26 de julho, é também um tributo à continuidade da luta seringueira. A escolha por apresentar as peças na Casa de Criadores reforça o compromisso da artista com uma moda que denuncia, propõe e emociona. Cada peça carrega não só tecidos e bordados, mas também histórias de resistência, memória viva e sonhos costurados à mão.
Angela e Day Molina na frente da casa de Chico. Foto: Karla Martins
Ao homenagear Chico Mendes, Day Molina faz mais do que olhar para o passado. Ela constrói uma ponte com o futuro, onde a moda pode ser floresta, luta, afeto e transformação. Como ela mesma diz:
“Essa relação ancestral sempre leva a gente pelo caminho que a gente tem que estar mesmo”.
Acre como costura da mensagem
Ao entrar na casa onde Chico Mendes viveu, em Xapuri, Molina se emocionou:
“Não dá para falar do Acre sem estar dentro do Acre. Foi importante vivenciar tudo isso, não só para criar uma coleção, mas para sentir de verdade”, ela afirma, após passar dias na Reserva Extrativista Chico Mendes mergulhada em conversas com familiares, companheiros de luta e trabalhadores da floresta.
A floresta também entra como protagonista, literalmente. A coleção utiliza látex nativo extraído por seringueiros da Resex, couro de pirarucu e lapeira — materiais que reaproveitam recursos naturais de forma sustentável — além de algodão orgânico e tingimentos com pigmentos vegetais.
“O látex é uma forma de mostrar ao mundo que a floresta é muito mais valiosa de pé. Busquei construir essa coleção ouvindo os seringueiros, os artesãos... cada peça carrega uma história”, conta.
Mais do que roupas, a coleção oferece ao público um convite à memória e à consciência ambiental.
“O que eu mais desejo é que pessoas que ainda não conhecem Chico Mendes possam conhecê-lo. Se o público entender a importância do que ele representa, eu cumpri meu papel, como criadora e como ser humano”, finalizou.